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quinta-feira, 21 de junho de 2018

CANTINHO DOS LOBOS DO MAR. Por Carlos Barros

CANTINHO DOS LOBOS DO MAR.

Por Carlos Barros

Os cigarros misteriosos…

O Romão era um velho conhecido, pelos professores na Escola Primária de Esposende pelas suas mirabolantes matreirices mas, estava sempre pronto a fazer recados e nisso era artista em cumpri-los, nem sempre à risca!...
Na sala do professor Carlos M., na segunda classe, o Romão  rezava por um recado e  para ele, a Escola era martírio faltava-lhe a ribeira para  as suas incursões beligerantes, e de repente “acordou” porque o professor chamou- o para ir comprar um maço de tabaco CAMEL, à Nélia. A sua pulsação alterou-se e, muito educadamente, o Romão levantou-se da carteira, piscou o olho ao Zé Pompeu e pegou, com aspecto lânguido,  nas cinco croas que o professor lhe deu para comprar os referidos cigarros.

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Por CARLOS BARROS

Um Natal especial….

  Em pleno período natalício, o senhor David Loureiro gozou um dia de folga e, como amante do mar, foi dar uma voltinha pelo areal até Cepães, sempre à procura de novidades e oportunidades….
  O senhor David, antigo guarda fiscal, sempre gostou do rio e do mar e um dos seus últimos barcos de pesca e recreio foi o ALVOR que acabou por ser destruído pelas tumultuosas marés que se fizeram sentir no passado inverno, no rio Cávado tendo a água do rio chegado a galgar a marginal, lançando muito  entulho para terra.
 Este esposendense nas suas horas vagas, percorria o rio Cávado lés-a-lés apanhando, à rede ou com recurso ao “carapau”, solhas e irões, estes no meio do limo ou por debaixo dos pedregulhos.
  O David, em sua casa, estava a conversar com a mulher sobre o almoço para esse dia e, com a mão na cabeça, coçando-se de uma mosca que lhe estava a atormentar, perguntou-lhe:
 -Mulher, o que vamos comer ao nosso almoço?

sábado, 2 de novembro de 2013

CANTINHO DOS LOBOS DO MAR - O barco fugitivo, …

O barco fugitivo,

Por CARLOS BARROS



   No cais norte, muitas peixeiras esperavam pelos “lobos do mar” e, enquanto que estes não chegavam,  seguiam-se gritarias, balbúrdias, confusões, algazarras   e discussões sobre a venda e o lucro  do peixe vendido no dia anterior.
  A tia Silvana, tia Criolice, tia  Genoveva, Inocência, tia Antónia, tia Carolina, Antónia da Galga, tia Ondina, tia Torcata,  tia  Maria Grande, tia Graça, Amélia Pichela do Curico,  tia Cila, entre muitas outras “tias”, estavam todas presentes no cais, sob o olhar desconfiado do guarda-fiscal,  prontas a comprar o peixe, arrematado pelos pescadores das catraias e afinavam a grossa voz. Pareciam “rouxinóis”  enrouquecidos…
   Ao longe, entrando na barra em direção ao “dorso do Cávado”, com a sua “pele” luzidia e azulada de um tom celeste,  as catraias iam chegando, uma  a uma, com a corpulenta Cornuda à frente,  perante a alegria das peixeiras que auguravam, pelo seu semblante, abundância de peixe, especialmente de raias, peixes-sapos, feiticeiras  e muita faneca.
  Com remadas fortes e ritmadas, as catraias acostaram ao cais, com as suas ancoras lançadas para o fundo do rio, bem presas e começa o festival da descarga do peixe com os gigas cheinhas a transbordar de pescado fresquinho, raias a “esbracejar”,  cações a “resmungarem”,  lavagantes e lagostas “espreguiçando-se” nas cavernas das catraias, congros apelando à vingança, peixes-sapos moribundos fisgando o ”infinito”, peixes-rosas com o seu ar angelical, cações  mordendo o ar,  as fanecas coitadas,  já todas com a certidão de óbito, assinadas pelos “moços” das catraias.
    O peixe lançado na rampa do cais, foi logo arrematado pelo Sampaio, tio Miguel e  Muchacho e , passadas umas breves horas, foi todo vendido e colocados nas gamelas das peixeiras para ser vendido em Esposende e aldeias do concelho: Góios, Palmeira, Fão, Marinhas, S.Bartolomeu do Mar, Belinho e mesmo em Forjães, após  longas caminhadas de  quilómetros infindos.
   Estas mulheres corajosas iam a pé a Barcelos, por vezes duas vezes: de manhã levavam sardinha e à tarde faneca e saiam de madrugada de Esposende, às duas ou três horas da manhã, com o sol  dormindo em sono profundo.
  Nessa manhã, a última catraia a ser limpa  foi  a do José dos Passos Pereira, apelidado por  “Zé Tolo”, filho do saudoso Albano P. Laca e da Tia Adelaide, e o Zé era peculiar pelo seu tipicismo e forma de estar na vida. Era um fervoroso adepto do Sporting e do Esposende Sport Clube e, mais tarde, da ADE, um  sócio sempre com as cotas em dia. Era um apaixonado e colecionador  de bandeiras e “galinetes” (galhardetes)..
    Nessa tarde, o Zé  foi vigiar a catraia ao cais norte e convidou o Toninho Rego-António Marques Rego- a acompanhá-lo numa curta viagem pela ribeira, fintando os juncos e os varais com algumas raias  e polvos a secarem  sob  auspicioso sol que se fazia sentir.
  Chegados ao cais norte, o Zé e o Toninho entraram, por mera curiosidade,  num barco de recreio, com um reluzente motor  “Evinrude” , ancorado na rampa , e estenderam-se de barriga para o ar, apanhando os raios solares, bronzeando-se com uma esfregadela de água doce, com limo à mistura.
  Com aquele solinho  relaxante , os dois amigos adormeceram por momentos,   com a maré a  descer-vazar-  e com a embarcação de recreio  a soltar-se das  amarras, sem eles  se aperceberem que o barco  ia deslizando, em direção à barra.
   Num ápice, já com a cabeça atormentada pelo forte sol que se fazia sentir, estes amigalhaços acordaram da soneca e viram-se perdidos, sem  remos e muito menos  leme ou vela !
  Começaram a pedir por socorro e os gritos espalharam-se pela marginal  e a ribeira, como sempre, estava ocupada com jogos de futebol norte-sul, mudando aos cinco e acabando aos dez, com uma arbitragem sempre polémica porque  nesses jogos tinha de haver zaragata, fazia parte dos “regulamentos da ribeira”…Até  a  maçaricada que estava a bicar  no lodo,  levantou-se assustada!
 O tio Laguna do Salva-Vidas, tocou a sineta e os tripulantes do salva-vidas  rapidamente chegaram, em longas correrias.
  Já dentro do Salva-vidas “Vasco da Gama”, os remadores, com  fortes remadas, foram ao encontro do Toninho e do Zé, cuja embarcação estava prestes a entrar no mar. O Tio Laguna  saltou para  dentro do “barco dos aflitos”, amarrou o barco com uma corda ao salva-vidas  e trouxe-o a reboque até ao cais norte.
 Todos chegaram salvos a terra e o Zé, “Peguinha, voa, a voa…” saiu apressadamente do barco, e na rampa do cais, amarrou-o às argolas do paredão, com o Toninho a reforçar os nós, não vá   soltar-se novamente…
   O dono da embarcação de recreio, banhista de Braga,  ficou enriquecido com este novo “currículo”  do seu barco: uma viagem alucinante, rumo ao desconhecido
  O Zé olhou para o Toninho, com os cabelos “eriçados”, pelo pânico , disse-lhe:
- Toninho,  eu não tive culpa., o culpado foi a maré que estava na vazante e pensava que estava na “cheiante”…
 Não há problema , amigo “Zé”, eu não digo ao teu pai Albano Laca pois, se ele soubesse , “dava-te cabo do corpo” e eu não quero que isso aconteça…
 O Toninho Rego era um bairrista de “quatro costados”, de convicções fortes, respeitador, crítico, dedicado e cumpridor e era um excelente cozinheiro e doceiro.
 No dia vinte e oito de janeiro, de mil novecentos e noventa e sete, o Toninho “deixou-nos“ para sempre e Esposende ficou mais pobre com perda deste seu ente querido.
  Esta aventura terminou num silêncio comprometedor entre estes dois amigos e muitos outros esposendenses que souberam desta insólita e surpreendente viagem ,que poderia redundar em tragédia…
 No dia um de dezembro, José dos Passos Pereira, morador na rua 5 de outubro,  dias históricos- 5 de outubro e 1º de dezembro- deixou de pertencer ao “elenco dos vivos”, deixando-nos saudades.
  No “lusito celestial”, estes esposendenses continuam a “navegar” nas  águas serenas do Paraíso, abençoadas pela  ação divina,  norteada pela agulha de marear dos arcanjos.                                         

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Cantinho dos Pescadores de Esposende



O Cantinho dos Pescadores de Esposende foi
inaugurado hoje, dia 2 de outubro de 2013, pelas dezassete horas perante  uma numerosa e atenta assistência.
Os pescadores de Esposende ficaram com uma nova estrutura de lazer e recreio graças ao empenho da Autarquia de Esposende-Pres. da Câmara João Cepa,- , Pres. da Junta de Freguesia   Zé Feliz e Augusto Carneiro, Presidente da A.P.P.C.E.-
Estiveram presentes o Vereador do Desporto e Turismo prof. Rui Pereira, Vereadora da Cultura Dr. Jaqueline, Presidente do Forum Esposendense Fernando Pilar, entre outras individualidades locais  e concelhias.
        Na inauguração  usaram a palavra o Presidente da Câmara de Esposende João Cepa, Presidente da Junta de Freguesia José Felgueiras  e Presidente da Associação de Pescadores  Profissionais do Concelho de Esposende- A.P.P.C.E.- Augusto Carneiro.
        Esta estrutura foi benzida pelo novo  Arcipreste de Esposende Padre Delfim e posteriormente celebrou-se uma cerimónia religiosa.
        O Presidente da Câmara Municipal de Esposende João Cepa na sua intervenção, realçou todo o seu empenho e dedicação em prol dos problemas da classe piscatória- barra, assoreamento da marina sul...- e teceu sérias e frontais críticas à classe  política pelo incumprimento das promessas feitas para a resolução  da barra e assoreamento da marina.
        João Cepa, um amigo da classe dos pescadores e dos esposendenses  em geral e na sua despedida, pessoalmente, formulo votos de felicidades  no seu novo percurso profissional que se avizinha.
        João Cepa,  um Autarca que muito fez por Esposende, mormente nestes seus dois últimos mandatos, e que deixou uma obra que está à vista de todos nós.
        Como Presidente da ADE em 2004/2005  as minhas relações com a Autarquia não foram fáceis mas, reconheço que o João Cepa deu uma preciosa ajuda, nesse ano, para a sobrevivência da ADE.
De minha parte, se houve   atitudes  que desagradaram ao Presidente da Câmara de Esposende, peço desculpa porque sempre  defendi, intransigentemente, os  direitos e os interesses da ADE  e espero e estou plenamente confiante e convicto que o meu amigo Eng. Benjamim Pereira irá fazer um excelente trabalho  em Esposende.
Quando um Autarca ouve  os seus munícipes, a obra aparece...
Um até breve
 CMLB-

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Cantinho dos ”Lobos do Mar“ - Manhã fatídica…


Cantinho dos  "Lobos do Mar "

                      Manhã fatídica…
   Era uma manhã serena, dia seis de dezembro de mil novecentos e oitenta e quatro, com uma ténue névoa  afagando  a superfície do mar, um pouco agitado com um vento  “roçando “ao tempestuoso com bandos de gaivotas esventrando os ares, anunciando mau tempo.
   Os barcos de pesca de Esposende, várias motoras e traineiras,  sulcavam o mar, à procura do pescado porque os “tempos eram de miséria e fome”.
   Na  então vila de Esposende,  tinha soado que na costa havia muito camarão e estava a “monte” e a mensagem chegou ao João do Fá-João Marcelino Lima de Barros-, cuja motora estava em plena faina nas águas marítimas de Viana do Castelo onde o peixe e o marisco  abundavam.
   A traineira do José Paquete tinha apanhado muito camarão na véspera e esta notícia espalhou-se aos “sete ventos”.
   O João do Fá, mestre da embarcação “O mar obedece a Jesus”, com os seus tripulantes, os irmãos Tino –Ernestino Moreira Ferreira- e Tone –António Moreira Ferreira-, ambos de Fão, e o “Morrosol”-Alfredo de Jesus Bernadino- estiveram no arrasto ao camarão e no regresso, a Esposende, onde o João tencionava  pintar a motora, mesmo à entrada da barra, sempre traiçoeira e mortífera, a motora ficou em seco,- na surriba-  tendo poderosas vagas apanhado de lado a embarcação, num ímpeto de força desmesurado,  atingindo  a casa de leme-cabine- que foi “arrancada” e onde se encontrava o mestre João do Fá, que teve morte quase imediata, tendo os demais tripulantes sido projetados ao mar e o infeliz Tone fangueiro, debateu-se corajosamente contra as águas furiosas desse mar encapelado, e esteve a lutar pela vida durante muito tempo até que, fisicamente,  soçobrou, afogando-se.
   Os demais tripulantes, conseguiram salvar-se, tendo sido um deles,  o Alfredo “Morrosol” sido transportado na ambulância, dos Bombeiros Voluntários de Esposende  para o hospital Valentim Ribeiro tendo os bombeiros Adélio Pezinho e o Artur Miquelino, prestado  os primeiros socorros de reanimação.
Dizia o Adelinho aflito:
-Artur, o Alfredo está morto! Ele está branco como a cal!---
-Espera, vamos fazer reanimação para salvar o homem, disse desesperadamente o Artur Miquelino.
Depois de várias massagens abdominais, o Alfredo Morrosol começou a abrir os olhos e recuperou a consciência.
-Estou a tremer,  dizia o Morrosol, tiritando de frio ao Adelinho.
-Cala-te, estás vivo meu homem, saltou de contentamento o Artur e o Adélio Pesinho.
   O Ainho -Manuel Viana Eiras-, familiar do Tone e Tino fangueiro, era para ir nesta motora, ficou na cama porque anteriormente tinha estado no café ”Doli,” junto aos Bombeiros antigos, até às duas da madrugada, com outros pescadores, seus amigos, a matar a sede…
   Para além do Ainho, faziam parte da tripulação da embarcação “Mar obedece a Jesus”, o João “Jeromes”, filho do João do Fá, o Bidú e o Rogério “Chana” que tiveram a felicidade de não embarcarem na motora, nesse dia um pouco tempestuoso e de maus presságios.
   Esposende ficou de luto com a perda destes dois esposendenses, com graves repercussões para a família das vítimas, já que o João do Fá, deixou  cinco filhos órfãos e a viúva Ana Maria, mergulhada em tamanha tragédia teve que enfrentar a vida para sustentar os seus filhos,-um rapaz e quatro raparigas- e que, corajosamente, conseguiu, sendo agora pessoas bem sucedidos na vida mas, sempre amargurados pela morte do seu querido pai.
  O João Marcelino, pescador experiente, muito  corajoso e aventureiro, na ânsia de lutar pela vida, ficou perpetuado no seio da classe piscatória, era um pescador sociável, sendo uma referência como homem de coragem e conhecedor dos meandros e traições do mar e que, naquele malfadado dia, a fúria do mar e a  inconstante barra traíram-no numa “emboscada” inesperada e fatídica.
   Fez no dia vinte e seis de dezembro, vinte e oito anos, que aconteceu esta tragédia em que o mar ”não obedeceu a Jesus” e o Alfredo, por sinal, de Jesus, conseguiu milagrosamente “safar-se“ retomando a vida de pescador e, mais tarde de Trolha, onde faleceu, ao cair abaixo de um andaime quando trabalhava na construção civil.
   No dia anterior, o Santos Coutinho, também pescador experiente, tinha deixado quatro margotas-peixes- no Café Oliveira para o amigo Alfredo “Morrasol” e, infelizmente, não chegaram ao seu destino.
    O “Mar obedece a Jesus” foi vítima de um mar inesperado, que “cravou” as suas ondas assassinas contra a embarcação, enlutando Esposende e a sua classe piscatória, em especial.

Carlos Manuel de Lima Barros
3 de dezembro de 2012

(Entrevistas com Romão Miquelino, Santos Coutinho,  Ana Maria,  Tonó, “Ainho”-Manuel Eiras,-  João Careca e Adélio V.Boas

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Carlos Barros - Cantinho dos Lobos do Cávado



  As motoras/traineiras  de Esposende:

  Esposende, não há muito tempo, teve várias motoras e traineiras onde os pescadores exerciam a sua atividade piscatória e ganhavam o  “pão nosso de cada dia”, tendo que enfrentar, corajosamente, as   agruras do mar e as intempéries rigorosas, perante uma barra sempre traiçoeira e extremamente perigosa.


  “CANTINHO DO PESCADOR.”:

     “O beijo da vida…”

    Estava uma manhã serena, com uma névoa marítima a refrescar os corpos da tripulação da motora Filomena Antonieta, propriedade do Mestre João Careca – João Pinto Loureiro- e esta embarcação, depois de entrar  a “toda a carga” no mar, serpenteando-se  ao largo da restinga, lançou-se à pesca  de arrasto, do camarão,  ao longo da  costa.
   Estavamos em pleno Verão, onde o sol ainda “ressonava”…
   A tripulação da Filomena Antonieta, constituída pelos esposendenses Rodolfo “Ilhoca”-Rodolfo Eiras Afonso Neto-, que ia destemidamente ao leme, Tone Pirata, Chico-irmão do João Careca-, “Sai Sai” – Anselmo Saganito-, Augusto Sancho, Alfredo “Morrossol”, Milo-Emílio Lima- e o Mestre João Careca, pescador experiente e respeitável, velho “Lobo do Mar”, lançou as suas redes de arrasto, ao longo da costa, esperançosos numa boa pescaria de  camarão que, possivelmente, seria vendido à Teresa do Castelo, comerciante dinâmica e simpática mas, uma mulher de “armas”, uma “expert” a comercializar o marisco – lagosta, lavagantes, sapateiras, “caranguejas”,  camarão…-pescado nas águas marítimas, a poucas milhas da nossa orla marítima...
   A motora, em plena atividade piscatória, lá ia na sua atividade de arraso, com as “portinholas” beijando o fundo do mar,  “recebendo no seu “regaço” o marisco e eis que o sempre brincalhão Milo,  ilusionista “de profissão”, dirigiu-se ao “Ilhoca” e pergunta-lhe:
 - Vamos fazer uma aposta “Ilhoca”?
  O que é que queres,  já me vais lixar , “Calhalho”, disse gaguejando o “Ilhoca”….
  Olha,  vou  engolir  aquele linguado que está no convés !...
  Queres apostar  duas malgas no barrigana ou no Abílio Coutinho,  desafiou o Milo ao seu parceiro de barco.
  O “Ilhoca” curioso, colocou a boina para trás, ” arregaçou “ os olhos, deixou  o gigão que tinha nas mãos e disse-lhe:
 -“Nem és homem nem és nada”, se não fizeres isso, mas olha bem, as malgas de vinho não aposto porque tu só podes é beber pirolitos ou laranjada, respondeu, com o seu sotaque  o “Ilhoca”….
    O Milo pega no linguado, perante os olhares dos amigos e mete-o  pelo “garganil “ abaixo mas, desgraçadamente, o  peixe não deslizou e ficou encravado na garganta do aflito Milo.
    Aí que vou morrer, gritava o Milo, já a ficar negro, como  carvão…
    Vai buscar um anzol do congro, gritou o Chico ao Sancho e ao “Sai Sai” que estavam mais perto!
    O “Morrassol” e o Tone Pirata já rezavam ao Nosso Senhor dos Aflitos e à Nossa Senhora da Saúde  pela saúde do Milo, cada vez, de rosto mais branco como a cal.
    O Milo já estava  a “espernear”, com falta de ar” e, num  gesto  fulminante, o Chico  encostou a boca à do Milo, e com os  seus poderosos dentes, crava-os no rabo do linguado e retira-o da boca do desesperado e amarelado Milo que ficou com a boca ensanguentada porque os seus lábios  ou ”beiças”, como dizia o  Sancho,  foram lixados pela  rugosa pele do  linguado areeiro.
   Após breves minutos, já restabelecido, o Milo abraçou-se ao Chico e, com voz trémula, disse-lhe:
- Irmão, salvaste-me a pele e já estava no “outro mundo” se não fosses tu, meu irmãozinho!...
  O Chico e o seu irmão João Careca,  que  assistiu muito aflito ao “salvamento” do Milo, ficaram descansados ao ver o Milo a respirar e aos “pinotes” de contentamento.
  Maria Antonieta, depois de recolher as redes  com uma boa pescaria, regressou ao cais Norte de Esposende, atracando nas calmas águas do Cávado, onde algumas peixeiras e a Teresa do Castelo, impondo a sua compleição física e empurrando-as para o lado,   esperavam pelo pescado.
  Comprada toda a “mariscada”, a Teresa dirijia-se à loja do Coutinho, onde o Carlinhos da Jandira, pesava todo o marisco, inclusive, grandes lavagantes e lagostas na balança de pratos que reluziam, depois de serem lavados, com areia e limão, pela Glorinha e pelo Carlinhos, nas horas vagas.
     Como  recompensa, a Teresa oferecia um pequeno lavagante ao Carlinhos que a sua Tia Alice cozia numa panela, sendo logo ingerido, acompanhado com um bom traçado-vinho com gasosa- e um sumol que o Carlinhos bebia, deixando, um “fundinho” no copo para saborear com o caldo de feijão com  “troços”.
     A Maria Antonieta, comprada pelo sr. João Careca por quarenta contos, (e com anzóis ,como afirmou…) a um guarda-fios, que se tinha tornado pescador, acostou ao longo do paredão, sendo segura pelas fortes “amarras” às argolas, junto às escadinhas, onde “se curavam” os tremoços da M. Amália-famosa tremoceira- e da Tia Aninhas.
   Toda a tripulação, depois de lavar todo o convés do barco e do porão, veio para terra, para descansar por umas horas,  todavia foram “assinar o ponto”, comandados pelo Tone Pirata, Ilhoca e “Morrassol”, ao Barrigana, outros porém, dirigiram-se à Lucas e ao Coutinho, para  provarem o saboroso vinho do Tio Firmino de Vila Cova, que deixava marca nas malgas. Era um tintol de luxo, como dizia o Tio Rogério e o Geno nas suas conversas na tasca/armazém do Coutinho, sentados nos sacos de feijão e de milho …
   O Pezinho, cliente assíduo, do Coutinho, bebia uns “penaltis” valentes e a garganta nunca secava…
   O José da Lucas, um “bebedor” sapiente e moderado, uma malguinha, no máximo duas, dava-lhe para toda a tarde, e o aperitivo era falar e defender o Benfica, acolitados pelo Rogério que só falava do Coluna que para ele, era  o melhor jogador do Benfica, dizia-me ele nas suas   “vivas conversas”.

   Nesses tempos,  os pescadores de Esposende no inverno, raramente iam ao mar, que estava quase sempre “virado ou picado” e conviviam, naturalmente, nas Tascas, onde passavam as tardes, conversando e discutindo as suas histórias, as suas ricas vivências, um património histórico/cultural que  deveremos preservar, registando-as e divulgando-as.

Carlos Manuel de Lima Barros

Nota:
Esta história é verídica e foi-me contada e recontada pelo Emílio Lima- Milo-,  Francisco  Loureiro- -Chico-, João Pinto Loureiro- João Careca- e teve como palco, a motora Filomena  Antonieta, no longínquo ano de 1967.