quinta-feira, 21 de junho de 2018

CANTINHO DOS LOBOS DO MAR. Por Carlos Barros

CANTINHO DOS LOBOS DO MAR.

Por Carlos Barros

Os cigarros misteriosos…

O Romão era um velho conhecido, pelos professores na Escola Primária de Esposende pelas suas mirabolantes matreirices mas, estava sempre pronto a fazer recados e nisso era artista em cumpri-los, nem sempre à risca!...
Na sala do professor Carlos M., na segunda classe, o Romão  rezava por um recado e  para ele, a Escola era martírio faltava-lhe a ribeira para  as suas incursões beligerantes, e de repente “acordou” porque o professor chamou- o para ir comprar um maço de tabaco CAMEL, à Nélia. A sua pulsação alterou-se e, muito educadamente, o Romão levantou-se da carteira, piscou o olho ao Zé Pompeu e pegou, com aspecto lânguido,  nas cinco croas que o professor lhe deu para comprar os referidos cigarros.
O Romão saiu da sala em velocidade de cruzeiro e mal saiu da Escola meteu as mudanças e foi dar a voltinha pela ribeira, para cheirar o odor do lodo e do limo, e só depois é que foi em direção à Nélia,  ao balcão da tabacaria  para comprar o maço Camel.
O sr. Manuel da Nélia ao ver o Romão àquelas horas, na Nélia perguntou-lhe:
 Ó rapaz que estás aqui a fazer a estas horas de Escola, fugiste de lá mais uma vez?
Não, sr. Manuel vim comprar tabaco para o professor Carlos M. e ele mandou-me vir aqui respondeu ousadamente o Romão, revelando uma timidez tremendamente falsa!...
 Ò Rites dá-lhe o tabaco  depressa e recebe primeiro o dinheiro porque nunca é de confiar…
 O Romão pagou os cigarros, recebeu o tabaco e saiu a grande “vitesse” pela porta fora, abrandando a velocidade perto da Lucas, virou para o lavadouro público, ao lado da Igreja e sorrateiramente, descolou a prata do fundo do maço e tirou um cigarro, tornando a colar a prata e o respectivo selo, com um pouco de “cuspe”.
  Já com o tempo a decorrer e com medo da palmatória do professor, o Romão entrou na sala e entregou o maço de tabaco ao professor que se“esqueceu” de agradecer, como  era  habitual…
   No recreio, o Romão chamou o Zé Pompeu, perante os olhares do Tone Passarinho, do Quim Tripas, do Eduardo Chora e do Zé Patuna, e segredou-lhe que no final das aulas iam fumar para a ribeira, por detrás do salva-vidas porque tinha um cigarro  Camel para ser dividido por eles.
Era o tempo em que havia “coriscas” a rodos mas, um cigarrinho fresco era outra “loiça”….
Os dois  mariolas, dividiram o cigarro entre si, e com fósforos de cera “Três Quinas” surripiados da casa do Romão, deliciaram-se a fumar, com o tio Abilio e a Tia Esmeralda do Salva-vidas, a observarem ao longe, junto aos varais das escadinhas, onde tinham umas redes –rascas- a secar.
 Seus corrécios , vou dizer aos vossos pais que estavam a fumar, ameaçou o tio Abílio aos fumadores de ocasião. Choramingando, junto ao tio Abilio, e os dois comparsas juraram nunca mais fumarem, tendo o tio Abilio perdoado a queixa.
 No dia seguinte, o professor pediu novamente ao Romão para comprar  dois maços de Camel à Nélia e, o filme foi o mesmo só que o Romão em vez de um, tirou três cigarros para dividir pelo Quim Tripas e pelo Tone Passarinho porque estes  tinham descoberto o roubo e ameaçaram-no acusar ao professor e, para evitar a acusação, tiveram que fornecer  dois cigarros aos velhos amigos.
 Quando o Romão chegou à Sala de Aula, o professor Carlos M. estava furioso pela demora do recado  e ao ver o Romão a suar de tanto correr, perdoou-lhe o correctivo e as ameaças  voaram em todas as direções…
O professor ao pegar num dos maços, achou-o muito “magro” e começou a apertar a embalagem que cedeu para azar do Romão.
Romão, faltam aqui cigarros, estás a ver este buraco?
Mais branco que a cal, o Romão começou a gaguejar e a trocar as palavras e confessou que não tinha sido ele!
Ai não fostes, então vais para o estrado que vais pagá-las:
O Infortunado aluno, levou doze palmatoadas com a “santa luzia” que lhe pôs as mão em brasa e revoltado, confessou que o Tone Passarinho e o Quim Tripas também tinham fumado…
 Com os nervos à flor da pele, o professor com o seu cabelo penteado para trás, inundado de brilhantina, mandou os restantes para o estrado e a pancadaria repetiu-se e corajosamente, ninguém chorou e os colegas da sala, num silêncio “cemiterial”, nem respiravam com o medo que pairava naquela sala.
 A partir desse momento, o Romão foi irradiado dos recados e foi o Carlinhos da Jandira, mais novinho, que o substituiu, entregando sempre os maços intactos, não cedendo às pressões dos mais velhos da Escola que lhe pediam um cigarrinho Camel.

O Romão, a partir desse momento, limitou-se a ir às “periscas” junto ao largo dos Peixinhos, onde estacionavam as camionetes do Linhares,  satisfazendo os  seu vício. Nos dias de feira,  o Largo dos Peixinhos convertia-se numa “eira de periscas” porque era o local dos passageiros que aguardavam, a “camioneta” para  Palmeira,  Perelhal, Barcelos ou mesmo Braga e os mais “fidalgos” deixavam quase sempre, metade do cigarro, para contentamento do Romão e seus comparsas…



      C.M.L.B
22 de outubro de 2016