VERDES EXIGEM ABERTURA DE NOVAS CANDIDATURAS PARA AGRICULTORES AFETADOS PELOS INCÊNDIOS FLORESTAIS DE OUTUBRO DE 2017
Será discutido amanhã, dia 13 de abril, em Plenário da Assembleia da República o Projeto de Resolução Nº 1492/XIII/3ª do Grupo Parlamentar os Verdes que recomenda ao Governo a abertura de uma nova fase de candidaturas simplificadas, até aos 5 mil euros, e de candidaturas no âmbito da medida 6.2.2 (Restabelecimento do Potencial Produtivo) do PDR 2020, com projetos acima dos 5 mil euros, de forma a permitir que quem não o fez no período anterior, possa apresentar a sua candidatura, ou a permitir que quem o fez no período anterior, possa proceder às correções que considere necessárias e que os agricultores afetados pelos incêndios, que tiveram prejuízos superiores a 5 mil euros, mas que, pelos mais diversos motivos, optaram pela candidatura ao regime simplificado, possam igualmente apresentar candidaturas e projetos acima dos 5 mil euros que não foram suportados pela candidatura simplificadas.
Neste dia será ainda o Projeto de Resolução Nº 1493/XIII/3ª do PEV que recomenda o apoio à agricultura familiar como forma de garantir a gestão e manutenção do espaço rural.
O Grupo Parlamentar Os Verdes
PROJETO DE RESOLUÇÃO Nº 1492/XIII/3ª
Nos incêndios florestais de
14 a 16 de outubro do ano passado, muitos agricultores perderam tudo num ápice
(casa, produção florestal e agrícola, animais, máquinas agrícolas). Para fazer
face aos prejuízos que estes agricultores tiveram, foram determinados dois
níveis de apoio, por parte do Governo, para que pudessem restabelecer, tanto
quanto possível e com rapidez, a sua atividade.
Um dos apoios
estabelecia-se em regime simplificado e abarcava prejuízos até ao valor de
5.000 euros, sendo a candidatura apresentada às Direções Regionais de
Agricultura e Pescas do Norte e do Centro. O outro nível de apoio
concretizava-se em regime normal de compensação pelos prejuízos nas explorações
agrícolas, em valor superior a 5.000 euros, e, neste caso, exigindo a
elaboração de um projeto que se revestiu de maior complexidade para muitos
agricultores e que requereu outro tipo de exigências tecno-burocráticas, e
exigindo também disponibilidade financeira por parte dos agricultores, por não
ser pago a 100%, sendo a comparticipação pública escalonada em função do
montante da candidatura, no âmbito do Programa de Desenvolvimento Rural (medida
6.2.2. do PDR) para o restabelecimento do potencial produtivo.
Em termos práticos, o que
se verificou foi que muitos agricultores, que tiveram milhares de euros de
prejuízo, foram empurrados para o pedido de apoio simplificado, com o teto
máximo de 5 mil euros. Isto porque as exigências tecno-burocráticas e
financeiras, necessárias para a apresentação de candidatura/projeto no âmbito
do PDR 2020, para investimentos superiores a 5000 euros, eram efetivamente
elevadas, e muitos agricultores não tinham também a capacidade financeira para
executar o projeto e nem tinham a certeza da sua aprovação.
Assim, muitos agricultores
para poderem ter assegurada uma ajuda, de modo a contribuir para endireitarem a
sua vida devastada pelos incêndios, viram como única alternativa o nível de
apoio inferior a 5 mil euros, estando, mesmo assim, sujeitos igualmente a
vários cortes, tendo em conta a subavaliação que foi feita em relação ao valor
de bens perdidos/ardidos.
Muitos agricultores não
tinham capacidade própria de pagar uma quota parte que lhe permitia aceder à
comparticipação pelos prejuízos que tiveram depois do flagelo dos fogos
florestais, pelo que declararam níveis mais baixos de prejuízo para poderem,
pelo menos, receber alguns apoios, mesmo não cobrindo o que efetivamente foi
perdido. Para os agricultores com condição económica mais frágil, que perderam
uma vida de investimentos feitos ao longo dos anos com sacrifício, mas com
dedicação, este modelo de apoio gerou-lhe, pois, uma enorme dificuldade e
prejuízos efetivamente não reparáveis.
Contudo, apesar deste
facto, o Governo tem referido, nomeadamente através da resposta à pergunta n.º
1052/XIII/3ª (Apoio aos agricultores vítimas dos incêndios florestais de
outubro de 2017), apresentada pelo PEV, que as decisões sobre o instrumento
mais adequado a cada situação concreta foi uma opção dos próprios agricultores.
O Governo considera também que «a adesão muito significativa dos
agricultores aos instrumentos de apoio disponibilizados para fazer face aos
danos provocados pelos incêndios registados em outubro de 2017, expressa pelo
elevado número de candidaturas e correspondentes montantes (…) confirmam
plenamente a adequabilidade dos apoios às circunstâncias, o conhecimento
generalizado dos apoios existentes e a inexistência de dificuldade da
elaboração de candidaturas». No entanto, nas deslocações ao terreno e nos
contactos que Os Verdes têm estabelecido com as populações afetadas, os
agricultores têm transmitido e demonstrado que as ajudas não foram as mais
adequadas, nomeadamente o montante das ajudas simplificadas.
Ao nível dos projetos
superiores a cinco mil euros a maioria dos agricultores que se candidataram,
têm sentido dificuldade financeira, devido à falta de fundos próprios e de financiamento
da banca, para executar os projetos, pois os valores de comparticipação
(variável) dos projetos aprovados só são pagos aos agricultores depois da
despesa estar comprovadamente realizada pelos próprios.
Apesar destes dois níveis
de apoio, um número elevado de pequenos agricultores, alguns que perderam a
totalidade da sua área agrícola e edificações de apoio não apresentaram
qualquer candidatura no âmbito da agrícola (regime simplificado ou normal)
pelos mais diversos motivos, nomeadamente por deslocação / emigração sazonal,
falta de informação, falta de apoio, falta de conhecimento, e alguns até pelo
facto de estarem isolados e sem comunicações.
O Governo refere que foram
disponibilizaram diversos serviços de apoio às populações dos municípios afetados
e asseguraram uma ação «porta a porta», através de unidades móveis
disponibilizando apoio direto e multidisciplinar às populações afetadas, sendo
que na área da agricultura foram facultadas todas as informações e
esclarecimentos sobre condições de acesso aos apoios disponíveis. Contudo, a
população e associações que se depararam com esta resposta do Ministério da
Agricultura à pergunta do PEV atrás referida, apesar dos esforços e medidas que
foram de imediato tomadas após os incêndios, consideram que esta informação não
corresponde à verdade, dado o número de pequenas explorações agrícolas que não
beneficiaram de apoios pelos mais diversos motivos, incluindo a falta de apoio
e informação.
Os agricultores e suas
organizações têm vindo a transmitir a necessidade de o Ministério da
Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural reabrir o período para novas
candidaturas, quer para refazer algumas candidaturas que foram apressadamente
submetidas com lacunas e omissões nos projetos, em particular ao nível da
restituição do potencial produtivo, quer de forma a abranger quem por diversos
motivos não se candidatou no devido tempo, nomeadamente por falta de
informação.
Os apoios são sobremaneira
relevantes, não apenas porque é devido auxiliar estas pessoas, que faziam da
agricultura a sua atividade e a tinham como forma de sustento, e que viram a
sua vida completamente comprometida com o terror dos fogos florestais de
outubro passado, mas também porque estamos a falar de zonas interiores do país,
que são zonas já bastante despovoadas e com uma necessidade de dinâmica
produtiva muito grande – ora, estes apoios são também a forma de o Estado
garantir que essa atividade produtiva seja retomada e que as pessoas não
desistem de ser agentes dinamizadores de um território que não pode ficar ao
abandono.
Assim, o PEV considera da
mais elementar justiça que se proceda à reabertura das candidaturas
simplificadas, de maneira a que quem não se candidatou tenha agora essa
possibilidade de o fazer ou de as corrigir, e que se reabram também as
candidaturas no âmbito do PDR 2020, medida «6.2.2. - Restabelecimento do
Potencial Produtivo» na Agricultura para que quem não se candidatou com
projetos acima de 5 mil euros os possa agora apresentar ou corrigir.
Para esse efeito, o Grupo Parlamentar Os Verdes apresenta o seguinte Projeto de Resolução:
Ao abrigo das
disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República
delibera recomendar ao Governo:
2- Que os agricultores
afetados pelos incêndios, que tiveram prejuízos superiores a 5 mil euros, mas
que, pelos mais diversos motivos, optaram pela candidatura ao regime
simplificado, possam igualmente apresentar candidaturas e projetos acima dos 5
mil euros que não foram suportados pela candidatura simplificadas.
Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 6 de abril de 2018
Os
Deputados
Heloísa Apolónia José
Luís Ferreira
PROJETO DE RESOLUÇÃO Nº 1493/XIII/3ª
E MANUTENÇÃO DO ESPAÇO
RURAL
O ano de 2017 foi, ao nível de incêndios florestais, o
pior ano de que há memória, e na memória ficarão as consequências catastróficas
provocadas pelos incêndios que ocorreram na zona centro e norte do país, designadamente
a perda de vidas humanas - mais de uma centena - os danos e prejuízos em
milhares de habitações, a destruição total ou parcial de centenas de empresas, as
milhares de explorações agrícolas afetadas, para além dos mais de quinhentos
mil hectares de área florestal dizimada pelas chamas.
Os incêndios de 2017 provocaram assim, impactos
incalculáveis a nível social, económico e ambiental que irão perdurar por um horizonte
temporal extenso se não forem tomadas medidas adequadas para os territórios
afetados diretamente, mas igualmente medidas transversais e nacionais que, de
forma integrada e sistémica, possam mitigar estes impactos e evitar que no
futuro ocorram catástrofes com esta dimensão.
Ficou evidente com os incêndios do verão de 2017, que tem
de ser invertido o paradigma e as opções políticas seguidas pelos sucessivos
governos. Ao longo de décadas as políticas têm sido contrárias às reais
necessidades do interior e das zonas rurais, em particular, invocando-se os
défices, os tratados orçamentais e os pactos de estabilidade e entre outros
argumentos de cariz meramente economicista.
O desinvestimento em infraestruturas e equipamento, o
encerramento de serviços públicos como escolas, centros de saúde, zonas
agrárias, esquadras e postos das forças de segurança, postos e estações dos
CTT, tribunais e tantos outros serviços associados à reduzida ou inexistente
oferta de transporte público e coletivo, tem empurrado as pessoas para os
centros urbanos, em particular para o litoral. Políticas que deram um claro
contributo para esvaziar mais o mundo rural e para lhe ditar uma sentença de
abandono e, por essa via, agravando a fragilização do espaço onde a floresta e
os matos se inserem, tornando-o mais vulnerável aos incêndios.
A presença de pessoas no mundo rural e as suas atividades
multifuncionais e multisetoriais são, desde logo, o garante da gestão deste
território e da prevenção de incêndios, que cada vez mais, têm assolado o nosso
país, em resultado das alterações climáticas, associadas ao desordenamento e
abandono do território, bem como às crescentes e extensas áreas de monocultura
de eucalipto ligados aos interesses das celuloses.
Embora os incêndios de 2017 tenham, para além das áreas
florestais, devastado espaços agrícolas e urbanos, é notório que as áreas
ocupadas por atividades agrícolas tiveram um papel importante e significativo
para evitar que a dimensão e as respetivas consequências fossem ainda maiores
àquelas que se verificaram.
O papel de tampão que as áreas agrícolas protagonizam na
defesa da floresta tem vindo progressivamente a diminuir e a ser eliminado, em
resultado da política da União Europeia e de sucessivos governos, que conduziu
à estagnação da produção agrícola nacional, quer em volume quer em valor, à
degradação do rendimento agrícola para a grande maioria dos agricultores, à
perda de perto de 550 000 trabalhadores da atividade agrícola, à eliminação de
cerca de 400 000 explorações agrícolas e a uma maior dependência alimentar do
exterior.
O abandono das áreas agrícolas e de pastagem, decorrente
de políticas de desvalorização da produção nacional, retirou território de
intermitência e de proteção da floresta e esvaziou uma boa dose de capacidade
de vigilância da floresta que as próprias populações, naturalmente, realizavam.
Apesar do crescente abandono e das inúmeras dificuldades,
algumas explorações agrícolas, a maioria de pequena e média dimensão, aliada à
mão de obra familiar, têm resistido e sobrevivido, continuando a ter um papel
preponderante, em particular no centro e norte do país, contribuindo para
tornar o mundo rural um espaço ainda vivo com todas as sinergias positivas que
daí advêm.
A agricultura familiar pela sua natureza multidisciplinar
e multifuncional, para além de constituir o pilar fundamental da nossa
alimentação, é também o suporte basilar da evolução da sociedade portuguesa ao
nível económico, da coesão social, da defesa do ambiente, do território e da
identidade cultural.
A pequena agricultura, por vezes complementada com o
rendimento de outras atividades, onde as mulheres detêm um papel determinante e
estruturante na gestão e na exploração, tem contribuindo para dinamizar as
economias locais, através de formas de comércio tradicional ou de proximidade
como são os mercados e vendas diretas, permitindo perpetuar o saber ancestral e
valorizar os recursos naturais e o território na produção de alimentos,
garantes da soberania e segurança alimentar.
Contudo apesar do reconhecimento da agricultura familiar
no desenvolvimento rural, esta tem sido esquecida e ignorada pelas políticas
nacionais e da UE, enfrentando, por isso, enormes dificuldades designadamente
no que se refere:
- Ao escoamento
dos seus produtos, uma vez que os pequenos e médios agricultores têm sido
excluídos dos grandes circuitos da distribuição agroalimentar;
- À inexistência
de preços justos à produção, que agravam a perda de rendimento dos
agricultores, nomeadamente dos pequenos e médios;
- Ao aumento dos custos de produção;
- A medidas
fiscais desadequadas às pequenas explorações e elevadas contribuições para a
segurança social;
- Ao cerco por
parte do grande agro-negócio multinacional que hoje representa interesses que
vão desde o sector financeiro e as suas atividades altamente especulativas, até
ao sector da indústria química e biológica;
- Ao desligamento
dos apoios à produção que prejudicaram os pequenos produtores e desincentivaram
a própria produção;
- Às dificuldades
em aceder a linhas de crédito e em fazer seguros para as suas produções contra
intempéries;
- Ao reduzido apoio ao movimento associativo e
cooperativo.
Entre tantas outras dificuldades pelas quais a
agricultura familiar tem passado e que poderiam ser aqui explanadas, os
incêndios do verão passado vieram reforçar as dificuldades já existentes, assim
como geraram outros problemas, em particular nas explorações afetadas
diretamente, com danos significativos e perdas consideráveis de rendimentos.
A agricultura familiar pelo seu papel multifuncional e
transversal e o seu contributo ao nível económico, social, cultural e
ambiental, tem de ser considerada e encarada com “olhos de ver”, uma vez que
representa a atividade que melhor pode contribuir para a gestão e
sustentabilidade do território, para a manutenção da diversidade das espécies,
para prevenir o flagelo dos incêndios e de combate e adaptação às alterações
climáticas.
Tendo em consideração os impactos dos incêndios de 2017,
as dificuldades pelas quais as pequenas e médias explorações agrícolas de
natureza familiar têm passado ao longo dos anos e o seu papel relevante como
bem e serviço público da agricultura familiar na defesa do mundo rural,
Os deputados do Partido Ecologista Os
Verdes, apresentam nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o
seguinte Projeto de Resolução:
A Assembleia da República recomenda ao
Governo que:
1- Promova
medidas para dinamizar e revitalizar os mercados locais e regionais, como
praças, mercados, feiras, no sentido de escoar os produtos provenientes da
agricultura familiar;
2- Incentive o
comércio de proximidade, nomeadamente os estabelecimentos de restauração a
adquirir produtos locais e regionais provenientes de pequenas e médias
explorações agrícolas;
3- Implemente
medidas para garantir o escoamento da produção agrícola familiar a preços
justos;
4- Agilize
fiscalmente a venda direta de forma a reduzir os custos e a respetiva
burocratização;
5- Nas cantinas
públicas e cantinas financiadas pelo estado seja dada preferência à aquisição
de bens alimentares para a confeção de refeições, oriundos da produção agrícola
familiar local e regional;
6- Regulamente
e fiscalize a atividade das grandes superfícies nomeadamente quanto aos preços
praticados, aos prazos de pagamento a fornecedores, e aplique quotas mínimas de
comercialização de bens agroalimentares de produção nacional e local;
7- Lance um
debate sobre a certificação alternativa ao nível alimentar, como é o caso da
certificação participativa que está a ser implementada nas relações entre o
produtor e o consumidor em vários países europeus;
8- Garanta
apoio técnico às pequenas e médias explorações agrícolas familiares,
nomeadamente através das organizações de produtores e cooperativas;
9- Reponha os apoios à eletricidade verde;
10- Apoie as explorações
de agricultura familiar e as suas organizações na transformação de produtos agropecuários
e florestais;
11- Fomente e
apoie as pequenas e médias explorações agrícolas na aquisição de pequenos
ruminantes, em particular de raças autóctones;
12- Crie
apoios, simplificados e a fundo perdido, para investimentos nas pequenas
explorações agrícolas familiares;
13- Adote como
princípio “produzir local, consumir local” como forma de desenvolver o mundo
rural.
Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 6 de abril
de 2018
Os Deputados,
José Luís Ferreira Heloísa Apolónia