Em Meio ao Caos

Há pouco tempo, reencontrei um velho condiscípulo, recém-regressado à sua terra após longos anos de ausência. O seu regresso, contudo, não lhe trouxe o conforto que outrora imaginara. Contou-me, em poucas palavras, os factos que passo a relatar.

Voltara ao país já marcado pelo tempo, trazendo consigo o peso das recordações de uma vida e a esperança de quem, mesmo tarde, precisava recomeçar para sobreviver. Mas o que o esperava era um país que, embora familiar nos contornos, lhe parecia estrangeiro. As ruas, algumas com outros nomes, mantinham o eco distante da infância; o rio e o mar, que sempre o acompanharam, permaneciam, mas as gentes eram outras.

O seu sotaque, ligeiramente diferente, depressa se tornou motivo de piada e críticas. A sua forma de falar e de escrever, que antes fluía naturalmente, agora soava estranha, inadequada aos ouvidos moldados pelas tradições. Era como se o tempo, em vez de preservar, tivesse esbatido o seu sentido de pertença.

Quando tentou retomar a carreira que tanto lutara para construir, encontrou apenas desconfiança. Diziam-lhe que os tempos eram outros, que o mercado estava saturado, e embora as palavras "fossem cuidadosas", o subtexto era bastante cruel: era velho demais para recomeçar. As portas que outrora imaginara abertas revelaram-se trancadas. E foi então que compreendeu que, por mais competência ou experiência que trouxesse, não bastava. Era preciso ter conexões, as ligações certas.

A velha máxima popular ecoava com uma verdade inescapável: "quem não tem padrinho morre pagão." Sem os contactos adequados, sem quem o guiasse pelos novos caminhos, o seu regresso transformou-se num isolamento silencioso, não num reencontro com a terra que lhe devia ser lar.

Foi nesse choque que ele entendeu, com amarga clareza, que voltar às raízes nem sempre é reencontrar-se. Muitas vezes, é ter de provar, mais uma vez, o seu valor num lugar que, paradoxalmente, já não o reconhece.

PT/AS

(O autor deste texto não segue as regras do novo acordo ortográfico)