ESPOSENDE E O SEU CONCELHO


sábado, 8 de agosto de 2009

A la française... - Max

MAX

- Olha quem ele é! – Surpreendeu-se Alex, ao reencontrar o velho amigo das brincadeiras da Ribeira e rival do sul, emigrado em França.
- Cada vez estás mais no…vo, messiú! – Respondeu, com a sua dificuldade de fala, o comparsa de escola e também camarada de armas, aos tempos da “velha Senhora”, em Angola.
- Então, por vacance(s)? – ripostou o comparsa, alinhando no bilingue do palavreado.
- Nunca falho às festas da Sra. da Saúde – adiantou o amigo e um habitué dos andores da procissão – Os meus filhos já nem ligam a isto, on restent en Nancy. Vim apenas moi, ma femme e este meu netinho, o Michele.
- Outros tempos! – Anuiu Alex – Eu continuo a cumprir a promessa de vir ver a entrada das bandas, ali à praça. Vou apreciar o contramestre do Zequinha que vai “reger” a banda dos Bombeiros de Esposende.
- Ele ainda improvise aqueles fa…dos e uivos guturais para os banhistas?
- Parece que sim, enquanto o tinto o anestesiar. Também te digo, sem estas figuras típicas de fazer engolir o cigarro, atrás da língua, por ilusionismo barato e dar o seu pé de dança, já nem parece Esposende!
- Uh la la!..! Acom…panho-te.
Agora, no largo da Câmara Municipal, à espera da entrada das bandas de música. Atento às diabruras de Michele, o avô tenta repreender o puto:
- Michele, tu vas tomber!
- Mais non … grand- père…
O ameno da conversa seria interrompido pela entrada da primeira banda, lá dos lados de Águeda.
À frente, quatro elementos da Comissão de Festas, garbosos nos seus fatos de gala domingueira e da importância do momento festivo orientavam o desfile dos músicos, a caminho da Praça.
Logo atrás, na primeira fila, faiscando ao sol, canhões de quatro tubas douradas e reluzentes abriam alas, ritmando nos seus baixos a “Marcha” do compositor brasileiro Sousa. Nas filas imediatas, seguiam-se a artilharia pesada dos bombardinos, saxofones e as trompetes. Lá para o meio, uma infantaria de oboés e clarinetes disputava a primazia sonora às flautas e flautins nos seus tímbricos agudos. A fechar este pelotão musical, bombos, caixas e pratos varriam a metralha acústica os músicos da frente, em fole de concertina, num incentivo à vitória da contenda musical, ora iniciada entre as duas bandas, obrigando-os a acertar o passo e o compasso.
Ao longo dos nove minutos e meio de exibição, em ritual dos quatro pontos cardeais – Havaneza, Primorosa, Misericórdia e Câmara - os músicos como que cumprimentam cada parte da assistência para onde se vão voltando, exibindo as frases melódicas mais emblemáticas da “Marcha”.
Eis senão quando, entra em cena o nosso Zequinha que logo toma a “chefia” da banda. Mesmo sem batuta mas ao ritmo de quem também percebe da poda, aproveita para se exibir numas chicoelinas, enquanto logo, em passos de tango, imagina conduzir uma dama invisível, fazendo corar e distrair até as meninas dos flautins e do carrilhão de sinos que sorriem deste multifacetado “chefe” e “bailarino argentino” de última hora.
“Tararatátá…TáTá. PUM”. Era o final da exibição.
Aplausos da assistência.
O chefe da banda é apresentado às autoridades locais pela Comissão de Festas e cumprimenta o representante da autarquia e o Monsenhor, entre outras entidades oficiais, enquanto a assistência vaticina da qualidade e quantidade dos músicos.
Agora e a caminho do arraial.
Tenta refazer-se a banda mas a coisa parece feia, dada a dispersão atabalhoada dos olheiros que se confunde com a dos tocadores. A Comissão de Festas acaba por repor a ordem. E mestre Sousa lá vai sambando na sua Marcha enquanto as notas de música voam a caminho do palanque da Sra. da Saúde.
Para trás, o relógio da Câmara lavava as mãos da solenidade festiva daquelas catorze e trinta pois mantinha-se renitente e fiel no seu adormecimento de greve contínua, parado que estava, há anos, nas três e vinte e quatro da madrugada!…
Retomando a conversa.
- Então, que contas mais? – Reatava Alex.
- Olha pá, mes fils já eram, os ne…tos já são e agora estou qua…se na retrête …
- O quê, mas tu não trabalhavas nas obras?
- Mais oui! Que…ro dizer, que estou a tratar da minha re…forma.
- Fazes bem. Por cá, já só de bengala, com reumático ou esclerose múltipla comprovada é que a gente irá de vacances … p´rá retrete!...
- Ou la la? C’est tout une merde.
- …que já se cheira ao longe!
Entretanto, Michele insistia em escalar a estátua do Correia de Oliveira.
- Michele, tu vas tomber! – Preocupava-se, de novo, o avô.
Já lá para o final do desfile da Banda dos Bombeiros de Esposende, de S. Paio D’Antas, e os cumprimentos da praxe.
- Pois é, pá – rematava o françiú – logo no arraial vai haver dis…puta entre as duas bandas. Vou ver se também desenfer…rujo as pernas, se os gajos player umas rap …sódias.
Cada vez mais preocupado com o rapaz, que já se encarrapitara na careca do poeta.
- Michele, tu vas tomber…
Após queda do miúdo.
- Filho da pu…ta, já caíste!
Michele aterrara são e salvo nas hortênsias lilases do canteiro. Nada de grave, a não ser uns pequenos arranhões num braço.
- Mais non, Michele, c’est tous bien mon fils? - Afligiu-se então o avô.
- São crianças. Isso passa logo – despediu-se Alex – Se a malta não se vir, felicidades. Boas férias.
- A bientôt!

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