“Os últimos
três anos foram os melhores da minha carreira”
Desde que Paulo Gonçalves assinou pela Honda que o
piloto português alcançou as maiores conquistas como piloto de ralis. Por entre
os sucessos destaca-se a conquista do título de Campeão do Mundo de Ralis
Todo-o-Terreno em 2013 e, mais recentemente, o segundo lugar na edição de 2015
do Rali Dakar.
Historicamente, Portugal tem o hábito
de criar grandes aventureiros. Nomes que incluem, descobridores,
conquistadores... e pilotos de ralis! Portugal, uma terra rica na tradição dos
ralis todo-o-terreno, sediou o início das duas últimas edições africanas do
Rali Dakar, mas também é portador de um dos maiores especialistas dos ralis
todo-o-terreno: o piloto Paulo Gonçalves do Team HRC. Em Esposende, a sua
cidade natal, a estrela da Honda, ladeado pela sua esposa Sofia Gonçalves e os
seus dois filhos Érica e Ruben, fornecendo apoio motivacional adicional,
providenciam o apoio motivacional adicional com que Paulo Gonçalves enfrenta as
maiores e mais duras provas de TT do mundo.
Depois do segundo
lugar no Dakar 2015, voltaste à ação no Abu Dhabi Desert Challenge. Em que
forma se encontra Paulo Gonçalves?
Paulo Gonçalves: Estes
últimos dois meses desde o final do Dakar, onde consegui o segundo lugar,
aproveitei para descansar ao máximo. Recomecei o meu trabalho muito focado em
lutar uma vez mais pelo título mundial, mas infelizmente as coisas não correram
da melhor forma na primeira corrida onde acabámos por ficar afastados da
vitória na corrida à penúltima etapa.
O Dakar 2016 não
incluirá o Chile na sua rota, isso é uma grande pena…
PG: Sim, é
mesmo uma pena. O Chile tem sido uma parte muito importante do Dakar. O Atacama
sempre foi sinónimo de dureza pelas surpresas na forma como a corrida se
desenrola. O coração do rali sul-americano é, em grande parte, lá. Não sei o
que a organização vai fazer para compensar a sua ausência, mas com a
experiência que eles têm tenho certeza que estão à procura de uma solução. É
uma vergonha o Chile não ser incluído, mas o Dakar 2016 vai continuar a ser um
Dakar muito difícil certamente.
O Dakar 2014 foi
terrível para ti, mas redimiste-te ao terminar no pódio em 2015, com uma grande
hipótese de ganhar o rali, por ti e pela equipa.
PG: É verdade
que 2014 as coisas não funcionaram da melhor forma em todos os sentidos. Dois
meses antes estava a desfrutar do título de Campeão do Mundo, depois, na quinta
etapa do Dakar estava fora da corrida. Tinha grandes esperanças, mas tudo
correu por água abaixo. Foi um momento muito difícil para mim, mas mantive a
cabeça levantada e preparei-me para apoiar os meus colegas de equipa até ao
final da prova. Quando o Dakar terminou, passei a focar-me em mais uma
temporada do Campeonato do Mundo onde lutei até à última corrida pelo título.
No final, não fui capaz de ficar com o título mas tive de me contentar com o
segundo lugar.
Fomos para o Dakar
2015 com toda a equipa determinada a estar na luta pela vitória final. Sabíamos
que a equipa estava forte e bem preparada. O Joan Barreda estava na frente com
uma boa margem e eu estava a lutar pelo pódio mas infelizmente o Salar de Uyuni
deixou o Joan fora da corrida e também eu perdi tempo nesse dia também, mas
tive mais sorte do que os meu outros colegas de equipa e fui capaz de
permanecer na luta pela vitória. Depois de uma grande batalha terminei em
segundo lugar. Foi uma ótima maneira de colocar o acidente do ano passado para
trás das costas e grande motivação para a equipa que continua a querer quer
ganhar. O caminho está traçado e o momento da vitória vai chegar.
No Dakar os teus
companheiros de equipa ajudaram-te a superar alguns momentos complicados…
PG: Sim. Eu
tive alguns problemas na segunda etapa-maratona que não teria sido capaz de
superar sem a ajuda dos meus companheiros de equipa. Esta é a força da nossa
equipa: nós somos bem organizados e a equipa funciona da melhor maneira. O
Jeremias Israel fez um grande sacrifício para que pudéssemos continuar na luta
pelo pódio; O Joan Barreda, o Hélder Rodrigues, o Jeremias Israel e eu
trabalhámos bastante e a equipa foi recompensada com um segundo lugar. Este é
um dos grandes valores que a equipa tem e que funciona muito bem em conjunto.
Todos nós trabalhamos em conjunto para atingir os objetivos e principalmente a
vitória!
Vencer etapas e ter
uma boa equipa. Esta é 100% a filosofia da Honda.
PG: A
filosofia da Honda, desde que eu corro, tem sido a de vencer corridas. O
trabalho que nós empreendemos em todas as competições que entramos é feito para
ganhar: etapas, corridas... e se não o fizermos, temos que pensar que estamos a
competir com fortes rivais que também estão bem preparados. Mas a Honda começa
sempre com hipóteses claras de ganhar. As máquinas, a equipa, os pilotos...
tudo se prepara para ganhar. Acho que não houve um único rali desde que a Honda
voltou que não ganhámos pelo menos uma etapa. Nós ainda não alcançámos o
objetivo final, que é vencer o Dakar, mas se continuarmos assim lá chegaremos.
Algumas das
características que te definem como piloto são a tua resistência e o teu
espírito de sacrifício. Na tua preparação a tua vida familiar é também muito
importante?
PG: Os
pilotos, a este nível, são profissionais que sabem como fazer o seu trabalho.
Felizmente temos um trabalho que nos dá grande prazer e que nos motiva
diariamente. Fomos escolhidos para ocupar um lugar, mas isso tem que se ganhar.
A minha família é muito importante e isso traz-me muita estabilidade e faz-me
muito feliz. Não é fácil quando estou ausente por duas ou três semanas seguidas
e temos uma criança de seis anos de idade e uma criança de quatro anos de idade
em casa, mas isso acontece com muitas outras pessoas também. Temos que
encontrar uma maneira de não deixar que isso nos faça perder a motivação e a
concentração.
Os teus filhos são
muito exigentes? Será que querem que o pai volte sempre para casa com o troféu?
PG: O que eles
querem é que o pai chegue de volta são e salvo. Esse é o prémio mais importante
para eles. Nós praticamos um desporto de alto risco e os fatores externos que
afetam as corridas têm de ser sempre considerados. Mas eles sempre perguntam
sempre se eu ganhei. Explico-lhes sempre que o pai está na corrida com um leque
de outros pilotos muito bem preparados e com os mesmos objetivos. Quando não se
ganha, tem que se saber respeitar e valorizar o que se faz. Não devemos fazer
as crianças acreditarem que tudo se resume a ganhar ou perder. Eles devem
aprender a respeitar e dar o seu melhor. Em seguida, a vitória virá. Se não
vier, vai vir da próxima vez, mas temos é que estar sempre satisfeitos com o
trabalho feito.
Com valores como esses, muito em breve eles estão a ultrapassar o pai!
PG: Neste
momento eles ainda são muito pequenos para correr. Nem tenho a menor ideia se
realmente querem correr! Não vou pressioná-los a isso. Se eles assim o
entenderem, então aí sim vou tentar ajudá-los a fazê-lo bem.
A paciência é outra
das tuas virtudes…
PG: Depois de
mais de vinte anos de corridas é normal perceber que as coisas nem sempre
funcionam como queremos logo à primeira vez e então temos que esperar pelo
momento certo. Temos que encarar todos os momentos em nosso redor,
principalmente quando as coisas não estão a correr da melhor forma. A nossa
competição é como uma maratona: a corrida não se ganha no primeiro minuto ou no
primeiro quilómetro, é uma luta contínua.
Se olharmos para
trás, depois de uma grande carreira no Motocross, mudas para os ralis, especialidade
onde já conseguiste muitos sucessos.
PG: Corri no
meu primeiro Dakar há dez anos, mas não estava a competir ainda nos ralis, fiz
apenas o Dakar. Vinha do Motocross e pensava que o Dakar se conquistava logo ao
primeiro quilómetro. Obviamente, os resultados não vieram porque caí muito e
não tinha a menor ideia do que era a navegação.
Há cerca de quatro
anos atrás, a equipa Speedbrain deu-me a hipótese de deixar o Motocross e
entrar no mundo dos ralis. Foi uma grande mudança. Ao longo dos últimos anos
consegui estar na luta pelo Campeonato do Mundo e até mesmo ganhar. Agora estou
numa equipa que me permite trabalhar com os melhores meios e estou muito
satisfeito por aqui ter chegado. Os últimos três anos foram os melhores da
minha carreira e estão a ficar cada vez melhores.
Depois de tantos
anos de corrida, este é o melhor momento da tua carreira, com a melhor arma e
os melhores companheiros de equipa, onde já deixaste de ser um “outsider” para
te tornares um sério candidato à vitória em qualquer corrida que entrares...
PG: Aos 36
anos de idade tenho a melhor moto, a maior equipa e ao longo dos últimos dois
anos os melhores resultados da minha vida: um título de Campeão do Mundo e um
segundo lugar no Dakar. Isto é uma motivação gigantesca. De certa forma, 36 é
pouco. Talvez esteja a amadurecer como uma garrafa de Vinho do Porto... Aos 20,
25 ou 30 anos nunca fui capaz de obter resultados como estes. Mas agora estou a
subir o nível e a melhorar o meu desempenho, mas isso devo também à grande
equipa que está por trás de mim.
O próximo grande
teste é o Sealine Cross-Country Rally no Qatar. Esta corrida é muito diferente
do Abu Dhabi Desert Challenge, sem tantas dunas, mas com uma navegação muito
exigente.
PG: Com um
monte de trilhos pedregosos e muita navegação, terminando as etapas nas dunas,
quase todos juntos. Há cerca de 20% de areia e 80% de navegação. O objetivo da
equipa HRC é continuar a desenvolver a mota, uma vez que as nossas hipóteses de
conquistar o título de Campeão do Mundo ficaram reduzidas após os resultados em
Abu Dhabi. É por isso que haverá menos pressão. Vamos entrar na corrida muito
mais relaxados e podemos testar essencialmente a navegação e a mota.
Qual é a tua
opinião sobre a nova regra de se poder escolher a posição de partida na etapa
seguinte?
PG: A regra não
me parece justa. Em Abu Dhabi funcionou a meu favor, mas mesmo assim não me
parece certa. Espero que seja alterada, porque não é um método correto. A
corrida deve ser ganha pela própria corrida. Se a corrida obriga a parar antes
da linha de chegada para ter a hipótese de vencer, isso não é nada bom. Se
pudéssemos escolher apenas entre as três primeiras posições de partida para o
dia seguinte, então talvez fosse mais justo. Acredito que esta regra vai ser
modificada muito em breve.
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