A
motora Filomena Antonieta, com o mestre
João Careca ao leme, regressava
do mar depois de uma boa pescaria e no porão, reinava a boa disposição entre
todos os seus tripulantes, sendo dos mais animadores o Romão Miquelino, Alfredo
Muchacho e o “Morrossol”, sempre vítima
das brincadeiras do finado Muchacho.
O sol “espreguiçava-se” e estava quase
a desaparecer na linha do horizonte.
Na
motora reinava boa disposição e as águas
do mar estavam amansadas e “abrilhantadas”
por uma serenidade crepuscular.
O
Milo, o “Morrossol” e o Muchacho piscaram o Romão para “esquiar”.
Anda
homem, não és homem não és nada senão ”esquiares”…
Então, disse o Romão, vai haver
agora um espetáculo…
Toda
a tripulação ficou em silêncio e o Milo começou a arregalar os olhos para o
amigo “Magnório”, esperando a surpresa!
O
Romão pegou num “paneiro”, cheio de escamas e “langanhos”, atou-o às cordas do
arrasto, que estavam presas à poupa da
motora e eis o Romão montado na prancha
de “surf”.
O
“toda a carga”, gritaram os tripulantes para o mestre João Careca, que estava a
“milhas” do que estava a suceder…
Com
o motor barulhento e ferrugento da
Filomena Antonieta, a “todo o gaz”, o Romão começou a deslizar sobre as
águas do mar, feito turista, durante breves segundos.
De
repente, o motor da motora abrandou e o Romão mergulhou no oceano, até ao fundo,
depois de bater com a “mona” na poupa da motora.
-
Morrossol, o Romão desapareceu, disse o Muchacho aflitinho…
O
homem está afogado gritou o Chico! Ele
não aparece à tona!...
Na
casa do leme, o João Careca ao ouvir tanto rebuliço perguntou:
-
O que se está a passar aí?
Vai
haver “verdoada” grossa!...
-
O Romão não aparece e está no fundo do
mar, responderam, em uníssono, os tripulantes que estavam a assistir à
tragédia.
-
Num último ato de desespero , os pescadores puxaram pelas cordas que amarrava a
“tábua-surf” e lá veio o Romão agarrado ao paneiro, já branco e com a boca
cheia de areia.
Uma vez içado para o porão, com muito esforço
do Milo e do finado Muchacho, o Romão levou uns murros no estômago, deitou cá para fora uns bons litros de água e
começou a abrir os olhos.
Está
salvo, gritou o Milo “Rosas”, todo
contente.!
Depois de uns largos minutos de reanimação, o Romão apareceu ressuscitado e prometeu nunca mais
andar de “sequi” com esta tripulação “meia maluca” que o ia matando.
A
motora Filomena Antonieta quando chegou ao cais para descarregar o camarão e o Romão ainda recuperava as sua débeis forças
anímicas.
As
peixeiras, embrulhadas nos seus grossos xailes negros, no cais norte, perguntaram:
-
João Careca, o que fizeram ao Romão que está branco como a cal?
- Calem-se
“almas negras” que ia acontecendo uma tragédia por causa destes três malucos e
só me apetecia pegar no bicheiro e fisgá-los
a todos, respondeu nervosamente o João Careca.
O Romão foi “descarregado” no cais e, lentamente, dirigiu-me
para a rampa do cais, cheio de limo, e
estava ainda meio atordoado.
O
Milo e o “Morrossol” levaram-no a casa depois de lhe tirarem a areia grossa da
boca e dos ouvidos.
Não
digam nada ao meu pai, senão dá-me “cabo do corpo”, choramingou o Romão aos seus amigos.
Podes
estar descansado, disseram eles, nós não “abrimos o bico”.
No
dia seguinte, o nosso amigo Romão, todo
aperaltado, com a revista “O último desejo”, emprestada pelo Morrossol” debaixo do braço, fazendo-se de
“doutor”, foi passear pela ribeira, tentando-se livrar do
grande susto do dia anterior.
O
Romão uma vez na ribeira, sentou-se perto dos juncais e varais, onde estava um
polvo a secar, começou a folhear a revista do “Último desejo” que o “Morrossol”
lhe tinha emprestado e adormeceu uma soneca, só acordando com o chilrear dos
“charréus” que comiam as amoras das
silvas.
Quando
acordou, estava o Morrosssol junto dele e perguntou-lhe:
Já
leste a revista, “ó ranhoso”?
O
Romão olhou para o seu companheiro e respondeu:
-
Sabes qual era o “meu último desejo”?
-
Não, disse o “Morrossol” ao Romão que
estava meio sonolento.
Olha
o meu último desejo, era não te ver mais, desabafou o Romão para o seu amigo…
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