ESPOSENDE E O SEU CONCELHO


quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

... os esposendenses jamais esquecerão o Dr. Agostinho da Rua Reis.


Um testemunho….
Terminei a minha quarta classe antiga, “construída” tijolo a tijolo, com os mestres professores Agostinho, Carlos Martins, Beirão, Fernanda Pio e D. Isolina, dando os primeiros passos na “passadeira da instrução” na Escola Primária de Esposende, tendo em anexo, a  Cantina Escolar de Rocha Gonçalves, local onde os “pobres” amenizavam” a fome…
Deixei a pasta de linhagem,/cutim, libertei-me das lousas e ferrões, dos velhos e carunchosos livros escolares, cheinhos de moralidades e de ideologia que nos tolhia a liberdade e disse à minha mãe:
-Quero ir estudar para o Colégio Infante Sagres?
Então vai meu Carlinhos porque quero que seja alguém na vida e sem estudos não se é ninguém,  respondeu-me a minha mãe, já com um pensamento moderno de vida.
Numa  terça-feira, a minha mãe, deixou a tenda e a costura, fazendo descansar a agulha e o dedal,  e lá foi ela falar, toda animada com o Dr. Reis.
- Com a cédula em riste, folha de inscrição e a caderneta escolar –Lisboa-Imprensa Nacional-1962, nº 93-  preenchidas,  pago o selo fiscal de sete e quinhentos,  a Jandirinha  inscreveu o Carlinhos no Colégio I. Sagres, tendo previamente, orçamentado todas as despesas para a minha futura  educação. “A Jandirinha criava um “porco” para reforço do trimestre e os outros proventos vinham da sua atividade como feirante/comerciante.
Com o material escolar e livros escolares organizados, comprados na Papelaria Vieira e na Cávado, o Carlinhos entrou no Infante Sagres, todo aprumado, botinhas de pneu de avião, untadas com sebo,  a pedir futebol. Estávamos  no ano  de 1963.
Como meu encarregado de educação ficou o Dr. Agostinho da Rua Reis porque o meu pai ”esqueceu-se“ de ser pai…
No Colégio  Infante Sagres vivi a minha juventude, com alegria, paixão e entusiasmo de ser alguém na vida.
Tive imensos  professores: Dr. Belchior, sr. Prior de Fão,  Barros de Gandra, Dr. Alceu Vinhas,  Amélia,  e o inevitável  Dr. Reis, este sim,  o que mais me marcou positivamente sem, desprimor para os demais.
O Dr. Reis foi meu professor de Inglês,  Geografia e Francês, um professor polifacetado e de uma cultura geral ímpar, onde na pedagogia nas aulas era Mestre, motivando os alunos ao estudo e a serem aplicados nas aulas, todavia havia aqueles “profissionais do colégio” que nada ligavam e os livros repousavam alguma vezes, nas silvas, junto ao muro do Albano Laca, para o outro dia…
Nas aulas o Dr. Reis era sinal de respeito e dotado de um extraordinário profissionalismo  e só faltava dormir no colégio.
Fiz o meu segundo ano no dia 23 de julho de 1965 na Póvoa, levado para esse ”infernal Liceu” na camioneta do Linhares, com partida no Largo Rodrigues Sampaio,  com outros meus colegas tremendo de medo, pela ameaça  do  “chumbo”…
Em mil novecentos e setenta deixei, finalmente, o Colégio Infante Sagres, com o quinto ”na mala” que tanto jeito fez no serviço militar.
O Dr Reis era amigo do seu amigo e quantos frequentaram o Infante Sagres gratuitamente!... Era uma pessoa generosa por natureza e convivi muito com ele, nestes maravilhosos anos de Colégio em que tive o Tozé Reis, seu filho, como colega de carteira, no quinto ano,-dr. Zé Albino, Eng. Teixeira….- assim como, mais tarde, no mesmo ano, a  Drª Margarida Reis, sua filha. Como se depreende, fui um “quintista repetente”….
Para além de professor emérito, “jubilado no meu coração”, o Dr. Reis era um amante do desporto e do futebol em particular, e com ele, o Carlinhos não falava ou dizia mal do Porto e só o fazia ao meu amigo Tozé porque nesse tempo, o Porto pouco ganhava, e estava nas minhas “sete quintas”… se fosse agora… caladinho!...
Tive o privilégio de ter o Dr. Reis, nestes últimos anos, como vizinho –Rua Nª Srª da Graça- e quando o via a tomar o seu cafezinho/pingo  no “lotus”, acompanhado sempre com a sua inseparável esposa D. Mariazinha,  e a sua cunhada, o Carlinhos ia sempre dar-lhe um abraço, como amigo e encarregado de educação no seu Colégio Infante Sagres.
O nosso  quinto ano tínhamos uma equipa de futebol que fazia furor – Carlos Barros, Zé Albino, Reis, Afonso, Licínio…- e naquele campinho relvado/careca do Colégio eramos quase invencíveis  e nos campeonatos que o Dr. Reis organizava, o nosso quinto ano, era o Porto dos tempos de hoje… Quando o Dr. Reis assistia a alguns “nacos” dos nossos jogos, a velocidade duplicava e os golos apareciam… Ele dava-nos energia extra”. Era o nosso Mourinho, onde com a presença, “dinamitava-nos” na arte de bem jogar futebol.
O Dr. Reis foi um cidadão exemplar, ocupando inúmeros cargos, na sociedade civil e desportiva esposendense o que  comprova  o seu valor, verticalidade, caráter, responsabilidade, capacidade de trabalho e seriedade perante a sociedade que tanto o admirava.
Um dia, quando fiz o quinto ano, o meu encarregado de educação Dr. Reis disse-me:
-Carlinhos, se a tua mãe não tiver dinheiro para estudares na Universidade, eu ajudo-te.
-Ficaram-me estas palavras no coração, esses desejo de solidariedade, de humanismo de grandeza no bem servir  contudo, o serviço militar cortou-me as esperanças de continuar os estudos e a Guiné,  foi o meu destino mas,  a mensagem do Dr. Reis guardei-a no coração, como homem bom, sempre atento às necessidades do próximo.
Mais tarde, em 1984/85  frequentei a Faculdade de Letras de Coimbra-Curso de História- como trabalhador-estudante , durante  cinco anos e tomei “um banho e uma paixão por Coimbra que ainda hoje perdura..-O Dr. Reis, acompanhava-me no meu íntimo, nesses tempos estudantis.
Este testemunho, é apenas um desabafar de um trajeto de estudante no saudoso Colégio Infante Sagres onde o Dr. Reis me ensinou a crescer, como jovem e adulto e na rua, na saudação “especial”, dava-me quase sempre o “cachaço” amistoso da ordem, afagando-me com o seu  delicioso gesto e sorriso aberto, as minhas costas ou “cachaço” habitual.
O destino do Dr. Reis só poderá ser o Céu, “local” dos homens bons que honraram a solidariedade e o bem servir, neste “curto mundo” em que vivemos e no futebol, nos Bombeiros, no Colégio, no Forum Esposendense, na Câmara Municipal, e em inúmeros outros lugares, o Dr. REIS,  FOI ÚNICO e são estes ÚNICOS que merecem o Reino dos Céus.
Os ex-alunos do Colégio e professores que lá lecionaram, assim como funcionários, jamais irão esquecer o Dr. Reis pela filantrópica causa educativa/pedagógica que abraçou e que nos ajudou a sermos homens, cidadãos de pleno direito.
À sua família, atingida com esta inesperada e profunda dor,  os meus sentidos pêsames e podem crer que os esposendenses jamais esquecerão o Dr. Agostinho da Rua Reis.

                        Carlos Manuel de Lima Barros
Testemunho de um antigo aluno que tanto admirou e respeitou  o Dr. Reis.

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