Princípio da não privatização da água em discussão no Parlamento por iniciativa dos Verdes
Por iniciativa dos Verdes, que agendou para discussão o seu Projeto de Lei 15/XIII/1, o Parlamento discute na próxima sexta-feira, dia 5 de fevereiro, o tema da privatização da água. A iniciativa legislativa do PEV visa a proibição da entrega a entidades privadas das atividades de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, e das atividades de recolha, tratamento e rejeição de águas residuais, estabelecendo-se o princípio da não privatização da água.
Na passada legislatura, o Governo PSD/CDS avançou com uma reestruturação do setor da água que visou a fusão de sistemas, o aumento generalizado das tarifas e o afastamento da dimensão interventiva das autarquias e avançou-se com a privatização da EGF, uma empresa lucrativa da holding Águas de Portugal. A própria privatização da Águas de Portugal não foi posta de parte pelo anterior Governo e a porta ficou aberta para quem no futuro o pretender fazer.
Face à importância que tem este recurso essencial à vida, importa garantir que a privatização do setor da água não fica ao sabor das vontades de cada Governo, mas sim assumir a não privatização deste setor como um compromisso nacional e é essa a proposta de Os Verdes por via Projeto de Lei 15/XIII/1 apresentado – estabelecer o princípio da não privatização da água na legislação portuguesa, por forma a salvaguardar os direitos das gerações presentes e também das futuras.
O Projeto de Lei de Os Verdes será discutido na Assembleia da República na próxima sexta-feira, dia 5 de fevereiro, a partir das 10.00h.
O Grupo Parlamentar Os Verdes
2 de fevereiro de 2016
PROJETO DE LEI Nº 15/XIII/1ª
ESTABELECE O PRINCÍPIO
DA NÃO PRIVATIZAÇÃO DO SETOR DA ÁGUA, ATRAVÉS DA ALTERAÇÃO À LEI Nº 58/2005, DE
29 DE DEZEMBRO (QUE APROVA A LEI DA ÁGUA), COM AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELO
DECRETO-LEI Nº 60/2012, DE 14 DE MARÇO E PELO DECRETO-LEI Nº 130/2012, DE 22 DE
JUNHO.
Nota justificativa
A
água é um elemento natural suporte da vida no planeta. Por ser um recurso tão
essencial, é absolutamente vergonhoso e criminoso que 884 milhões de pessoas
não tenham acesso a água potável, que 2,6 milhares de milhão não tenham acesso
a saneamento básico, e que 1,5 milhões de crianças, com menos de 5 anos, morram
por doenças relacionadas. É, rigorosamente, o direito humano à água que é
negado a milhões e milhões de pessoas.
Por
ser imprescindível à vida, fulcral para a estabilidade dos ecossistemas e
fundamental às mais diversas atividades económicas, a água é um dos pilares do
desenvolvimento mais ambicionados pelo setor privado. Deter o controlo deste
recurso natural fundamental é, para o setor privado, usufruir de um dos mais
vastos poderes, com repercussão em dimensões tão relevantes para o
desenvolvimento como a social, ambiental, económica e de gestão territorial. Prova
disso são as sucessivas tentativas do Conselho Mundial para a Água (liderado
pelas multinacionais do setor da água como a Compagnie Generale des Eaux ou a
Lyonnaise des Eaux) para excluir o reconhecimento do direito humano à água
declarado pela ONU, procurando substituí-lo por um caráter economicista,
quantas vezes dissimulado pelo rótulo de “economia verde”.
Em
Portugal, ambicionando lucros garantidos, o setor económico tem batido
recorrentemente à porta de um poder político subserviente, com o intuito de ir
gerando domínio sobre o setor da água. Esse poder político, em Governos que
alternaram entre o PS e o PSD e também com o CDS, foi, sobretudo desde a década
de 90 do século passado, abrindo progressivamente a porta à vontade dos
privados naquele que se poderia tornar o negócio da água. De um direito
fundamental (assim expressamente reconhecido pela Assembleia Geral das Nações
Unidas, através da Resolução A/RES/64/292) os sucessivos Governos foram transferindo
esse estatuto para o plano da mercantilização.
Na
passada legislatura o Governo PSD/CDS avançou com uma reestruturação do setor
da água que visou a fusão de sistemas, o aumento generalizado das tarifas e o
afastamento da dimensão interventiva das autarquias, tornando o quadro mais
apetecível para o setor privado e avançou-se com a privatização da EGF, uma
empresa lucrativa da holding Águas de Portugal. A própria privatização da Águas
de Portugal não foi posta de parte pelo anterior Governo, como demonstram
declarações do então Ministro das Finanças Vítor Gaspar. Fez-se um caminho em
tudo compatível com um passo privatizador, que o anterior Governo dizia que não
daria na altura (resta saber se por falta de tempo ou se por outra razão), mas
que pode ser dado no futuro. Ora, tendo deixado a porta completamente aberta
para quem no futuro o pretender fazer e com a «casa arrumada» ou preparada para
o efeito, importa garantir que a privatização do setor da água não fica ao
sabor das vontades de cada Governo, mas sim assumir a não privatização deste
setor como um compromisso nacional.
É
essa a proposta que Os Verdes trazem ao parlamento, por via do presente Projeto
de Lei – estabelecer o princípio da não privatização da água na legislação
portuguesa (concretamente na Lei da Água, aprovada pela Lei 58/2005, de 29 de
dezembro), a qual todos temos o dever de adequar às necessidades do país, para
salvaguardar os direitos das gerações presentes e também das futuras.
Assim,
ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo
Parlamentar Os Verdes apresenta o seguinte Projeto de Lei:
Artigo único
A
presente lei altera o nº 1 do artigo 3º da Lei nº 58/2005, de 29 de dezembro,
aditando uma nova alínea com a seguinte redação:
«Artigo
3º
Princípios
1-Para
além dos princípios gerais consignados na Lei de Bases do Ambiente e dos
princípios consagrados nos capítulos seguintes da presente lei, a gestão da
água deve observar os seguintes princípios:
a) […]
b) Princípio da não
privatização do setor da água, nos termos do qual fica impedida a entrega a
entidades privadas das atividades de captação, tratamento e distribuição de
água para consumo público, e das atividades de recolha, tratamento e rejeição
de águas residuais.
c) [anterior b)]
d) [anterior c)]
e) [anterior d)]
f) [anterior e)]
g) [anterior f)]
h) [anterior g)]
i)
[anterior h)]
j)
[anterior i)]»
Assembleia
da República, Palácio de S. Bento, 3 de novembro de 2015
Os
Deputados
Heloísa
Apolónia José
Luís Ferreira