ESPOSENDE E O SEU CONCELHO


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quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Cantinho dos ”Lobos do Mar“ - Manhã fatídica…


Cantinho dos  "Lobos do Mar "

                      Manhã fatídica…
   Era uma manhã serena, dia seis de dezembro de mil novecentos e oitenta e quatro, com uma ténue névoa  afagando  a superfície do mar, um pouco agitado com um vento  “roçando “ao tempestuoso com bandos de gaivotas esventrando os ares, anunciando mau tempo.
   Os barcos de pesca de Esposende, várias motoras e traineiras,  sulcavam o mar, à procura do pescado porque os “tempos eram de miséria e fome”.
   Na  então vila de Esposende,  tinha soado que na costa havia muito camarão e estava a “monte” e a mensagem chegou ao João do Fá-João Marcelino Lima de Barros-, cuja motora estava em plena faina nas águas marítimas de Viana do Castelo onde o peixe e o marisco  abundavam.
   A traineira do José Paquete tinha apanhado muito camarão na véspera e esta notícia espalhou-se aos “sete ventos”.
   O João do Fá, mestre da embarcação “O mar obedece a Jesus”, com os seus tripulantes, os irmãos Tino –Ernestino Moreira Ferreira- e Tone –António Moreira Ferreira-, ambos de Fão, e o “Morrosol”-Alfredo de Jesus Bernadino- estiveram no arrasto ao camarão e no regresso, a Esposende, onde o João tencionava  pintar a motora, mesmo à entrada da barra, sempre traiçoeira e mortífera, a motora ficou em seco,- na surriba-  tendo poderosas vagas apanhado de lado a embarcação, num ímpeto de força desmesurado,  atingindo  a casa de leme-cabine- que foi “arrancada” e onde se encontrava o mestre João do Fá, que teve morte quase imediata, tendo os demais tripulantes sido projetados ao mar e o infeliz Tone fangueiro, debateu-se corajosamente contra as águas furiosas desse mar encapelado, e esteve a lutar pela vida durante muito tempo até que, fisicamente,  soçobrou, afogando-se.
   Os demais tripulantes, conseguiram salvar-se, tendo sido um deles,  o Alfredo “Morrosol” sido transportado na ambulância, dos Bombeiros Voluntários de Esposende  para o hospital Valentim Ribeiro tendo os bombeiros Adélio Pezinho e o Artur Miquelino, prestado  os primeiros socorros de reanimação.
Dizia o Adelinho aflito:
-Artur, o Alfredo está morto! Ele está branco como a cal!---
-Espera, vamos fazer reanimação para salvar o homem, disse desesperadamente o Artur Miquelino.
Depois de várias massagens abdominais, o Alfredo Morrosol começou a abrir os olhos e recuperou a consciência.
-Estou a tremer,  dizia o Morrosol, tiritando de frio ao Adelinho.
-Cala-te, estás vivo meu homem, saltou de contentamento o Artur e o Adélio Pesinho.
   O Ainho -Manuel Viana Eiras-, familiar do Tone e Tino fangueiro, era para ir nesta motora, ficou na cama porque anteriormente tinha estado no café ”Doli,” junto aos Bombeiros antigos, até às duas da madrugada, com outros pescadores, seus amigos, a matar a sede…
   Para além do Ainho, faziam parte da tripulação da embarcação “Mar obedece a Jesus”, o João “Jeromes”, filho do João do Fá, o Bidú e o Rogério “Chana” que tiveram a felicidade de não embarcarem na motora, nesse dia um pouco tempestuoso e de maus presságios.
   Esposende ficou de luto com a perda destes dois esposendenses, com graves repercussões para a família das vítimas, já que o João do Fá, deixou  cinco filhos órfãos e a viúva Ana Maria, mergulhada em tamanha tragédia teve que enfrentar a vida para sustentar os seus filhos,-um rapaz e quatro raparigas- e que, corajosamente, conseguiu, sendo agora pessoas bem sucedidos na vida mas, sempre amargurados pela morte do seu querido pai.
  O João Marcelino, pescador experiente, muito  corajoso e aventureiro, na ânsia de lutar pela vida, ficou perpetuado no seio da classe piscatória, era um pescador sociável, sendo uma referência como homem de coragem e conhecedor dos meandros e traições do mar e que, naquele malfadado dia, a fúria do mar e a  inconstante barra traíram-no numa “emboscada” inesperada e fatídica.
   Fez no dia vinte e seis de dezembro, vinte e oito anos, que aconteceu esta tragédia em que o mar ”não obedeceu a Jesus” e o Alfredo, por sinal, de Jesus, conseguiu milagrosamente “safar-se“ retomando a vida de pescador e, mais tarde de Trolha, onde faleceu, ao cair abaixo de um andaime quando trabalhava na construção civil.
   No dia anterior, o Santos Coutinho, também pescador experiente, tinha deixado quatro margotas-peixes- no Café Oliveira para o amigo Alfredo “Morrasol” e, infelizmente, não chegaram ao seu destino.
    O “Mar obedece a Jesus” foi vítima de um mar inesperado, que “cravou” as suas ondas assassinas contra a embarcação, enlutando Esposende e a sua classe piscatória, em especial.

Carlos Manuel de Lima Barros
3 de dezembro de 2012

(Entrevistas com Romão Miquelino, Santos Coutinho,  Ana Maria,  Tonó, “Ainho”-Manuel Eiras,-  João Careca e Adélio V.Boas