ESPOSENDE E O SEU CONCELHO


domingo, 29 de novembro de 2015

CANTINHO DOS LOBOS DO MAR. Por Carlos Barros


A conquista espacial….
(republicação)
Em pleno Outono, do ano de mil novecentos e sessenta e quatro, com o carnaval já passado, na Casa de Fotografias Fotobazar, rua Conde de Castro, vendia-se material escolar diverso, e também “as bichinhas” e “bombas de Carnaval” e, passada a época carnavalesca, sobrava sempre “arsenal pirotécnico” , que não se tinha vendido, nestes tempos de folia popular.
Ao sul de Esposende, predominava a “massa encefálica inteligente” com o José Alberto e o C. Miguel, “O Químico”, a destacarem-se com os seus projectos de submarinos e foguetões, em ensaios constantes, tendo como palco a ribeira ou mesmo a junqueira,  com o seu campo de futebol  para os nortistas, sulistas, jardinistas e centrais, disputando os seus jogos sempre aguerridos que terminavam  em mergulhos no rio Cávado, na companhia das ratazanas, que abundavam e dos cardumes de barbos que proliferavam na junqueira.
O C. Miguel sabia das habilidades do Né Beleza, rebelde nortista, embora pacifista, com os seus barquinhos de folheta, a navegarem a vapor, tendo como força motora uma vela de estearina que aquecia um mini recipiente de água que, por sua vez, accionava uma hélice e a embarcação  foi sucesso na ribeira, tendo como palco , como sempre, as águas do Cávado, junto à rampa sul.

Não querendo ficar atrás, na arte da inovação, “O Químico”, recolheu diverso material- canudos grossos das fazendas/tecidos do senhor Sá, cartão, tábuas de madeira das caixas de sabão rosa e amarelo do António do Sul, arames, embalagens da Maizena,…- e resolveu fazer um foguetão. Na sua oficina improvisada de sua casa, o foguetão começou a tomar forma e com a pólvora, comprada na Casa Braga ou tirada das bombas de carnaval da loja, colocou-a na cauda do foguetão, dentro do espesso canudo de cartão prensado, forrado com “prata” dos maços de cigarros CT e  do SG Ventil.
A rapaziada do norte e do sul souberam desta iniciativa e durante dias rondaram a casa do C. Miguel, junto ao grémio da Lavoura, para observarem o famoso invento mas este inventor, expedito e prevenido, não se deixou surpreender e guardou o foguetão a “sete chaves” num barracão do quintal.
Numa tarde de sábado, “O Químico” mandou alguns dos seus cicerones avisarem os ribeirenses que o foguetão iria ser lançado na ribeira, junto ao cais do sul e, pelas dezoito horas, com o sol já a esconder-se, o foguetão foi levado para a “rampa de lançamento” na ribeira e a “cambada”, quase todos descalços, aglomerou-se em grande número.
 Na ribeira, hoje Parque Radical, jogava-se futebol a “croa”, com o Nibra, Tachi, Luisinho, Arrebita, Concha, Renato, Augusto Piolho e da Galga, Casimiro “Tri Tri”, Zé Conainas,  Paulo  Gatinho, Carlinhos, Aicha, Santos,  Rogério Rites,  Airinhos, Fidós, Miquelinos, Mendanhas , em plena acção, correndo atrás da “redondinha”… Os mais velhos, Quim Tripas, Batista, Fernando Quintino, os Rosários-Mário e Fernando- Pompeu andavam no Campo do Quim Serralheiro e nas redondezas do Matadouro, fazendo “das suas”…
O foguetão, foi conduzido, para a ribeira num carrinho de mão, emprestado pela Maria Talhó, sendo colocado  na rampa do cais. O C. Miguel, autoproclamado cientista, entusiasmado pela numerosa assistência, pegou num isqueiro que tinha  saído nos cromos dos papeizinhos, na  Loja do António da “Lucádia” e  pegou fogo à pólvora do foguetão e o inesperado aconteceu:
Com a propulsão da combustão, o projéctil subiu três metros e explodiu, mergulhando “de bico” nas águas do Cávado, fumegando por todo o lado com o C. Miguel, envergonhado pelo insucesso da sua invenção. Todos os ribeirenses presentes começaram aos saltos, numa larga risota e, sobre a superfície das serenas e límpidas águas do Cávado, os destroços do foguetão foram pela maré, em direcção à foz perdendo-se no mar, já que a maré estava na vazante. Alguns destes destroços, cartão molhado e arames, ficaram nas redes da lampreia do senhor David que barafustou contra aquele “entulho”, sem saber da sua proveniência.
“Tanto trabalho para quê, queixava-se cabisbaixo O Químico”, com o seu irmão ao lado, desanimado, perante tamanho desastre!...
Eu pensava que o foguetão ia à lua, dizia o João Arrebita para o tristonho C. Miguel que se prestava para abandonar a rampa, uma vez que a negritude da noite avisava os ribeirenses de que estava na hora de irem para casa.
 No dia seguinte, na Fotobazar, o senhor Gomes, zeloso funcionário deste estabelecimento, perguntou ao Carlos Miguel se o foguetão já tinha chegado à lua e este, num tom de voz de desânimo e de revolta, respondeu:
-Ó senhor Gomes não me chateie, pois aquilo foi um fiasco….
A  mãe do C. Miguel, senhora esbelta e educada,  que  acabara de chegar à loja,  tinha ouvido   parte da conversa e perguntou o que se tinha passado!
O senhor Gomes, sempre expedito, disse-lhe que não tinha havido nada de especial e o Carlos Miguel, sentiu-se aliviado porque se a mãe soubesse do desfalque que fizera nas bombinhas de Carnaval, a tragédia seria maior…

 “Pescador de histórias”
Entrevista com o senhor António Silva Gomes
No Posto de Turismo de Esposende-CITE-
No dia 20-10-2015

Pelas dez horas e trinta minutos                     Carlos Manuel de Lima Barros